Férias de antigamente

Recordações de A-dos-Ferreiros 



Durante uma férias em A-dos-Ferreiros, Préstimo, há uns 51 anos, com um casal amigo (Olívio e Virgínia), encontrei e guardei este seixo do rio Alfusqueiro. Outros fizeram-lhe companhia e estão por aqui como símbolos de agradáveis momentos passados naquela aldeia do concelho de Águeda.
Na altura, a ida para A-dos-Ferreiros não foi por acaso. O saudoso Padre Lé, que havia sido pároco do Préstimo e pessoa bem relacionada com uma família local, resolveu o problema e lá fomos, creio que um mês ou perto disso, para uma habitação nova de um casal comerciante em Águeda. Outros ares muito diferentes dos nossos, com tranquilidade quase absoluta. A casa não tinha energia elétrica nem água canalizada, luxos para o tempo. A água era de uma fonte particular a que tivemos acesso e a luz vinha de candeeiros e velas. Para o quarto de banho e cozinha,  havia que trabalhar acarretando o precioso líquido. Para a sanita, tínhamos a água da chuva, que era aproveitada por canejas que a recebiam do telhado, ficando armazenada num tanque de onde a tirávamos com um balde.
Os passeios eram frequentes para ficarmos a conhecer a terra. E o rio, de águas límpidas e temperadas, davam para refrescar. No fundo do leito acumulavam-se seixos roliços de tanto saltarem serra abaixo. 
O contacto com o mundo não era muito. Vizinho da casa, um sapateiro (Serafim?), cujo nome não consigo recordar, abria a sua oficina para nos acolher e para podermos ler o jornal, Penso que o JANEIRO, assinado por uns tantos cidadãos de A-dos-Ferreiros. Quando por lá passavam, iam dar uma olhado aos títulos, desporto e pouco mais. 
Conversávamos com toda a gente. Alguns até nos contavam os seus progressos na vida, compra de terrenos que faziam, projetos  em curso. Um brasileiro, decerto com alguns meios de fortuna porque não trabalhava, destacava-se pelos seus ataques à Igreja Católica. Dizia-se que havia recebido as influências dos republicanos que por lá teriam andado nos princípios do século XX... E o pároco, o Padre Abílio, não entrava em discussões. Homem pacato, rezava as missas para pouca gente e criava frangos para sobreviver. 
Por hoje fico-me por aqui... Talvez volte outro dia.


Hora da Saudade




“Hora da Saudade” era um programa da Emissora Nacional, destinado a emitir mensagens para os bacalhoeiros portugueses, que se encontravam nos mares da Terra Nova e da Gronelândia. Na Gafanha da Nazaré, as emissões eram à noite e saíam do Cine-Teatro Triunfo, localizado na Cale da Vila, na Rua D. Manuel Trindade Salgueiro, na esquina com a Rua D. Fernando.
Há anos, ao manusear O ILHAVENSE de 10 de Setembro de 1953 encontrei a notícia que transcrevo, em jeito de recordação. Era eu, em nome da família, que participava na “Hora da Saudade”, lendo a mensagem previamente escrita e dirigida a meu pai, contramestre do arrastão Santo André, um dos campeões do mundo da pesca do fiel amigo. Recordo, com que saudade, esses momentos comoventes que por vezes me bloqueavam, tremendo na leitura. Como acontecia a tantos outros familiares dos bravos lobos-do-mar. Algumas esposas e mães, ora alegres e esfusiantes, ora tristes e mais comedidas, lá iam lendo com desenvoltura ou soletrando com dificuldade as mensagens, que o locutor anunciava, pausadamente. No meu caso, era assim: “Para Armando Lourenço Martins, tripulante do Santo André, vai falar seu filho Fernando.”
Eu lia, então, e quando terminava saía feliz. O meu pai, longe, muito longe, bem avisado, como todos, tinha ouvido a minha voz e escutado, e gravado na sua alma, a mensagem da família.
Aqui fica a notícia que li no jornal O ILHAVENSE:

Outras Férias — Serrazes

Solar dos Malafaias
Serrazes foi uma grande experiência de férias diferentes. O contacto com a natureza, virgem e verdejante, deixou marcas indeléveis no meu espírito e no espírito de todos os meus filhos e esposa. Não conhecíamos tal povoação do concelho de S. Pedro do Sul, mas um casal amigo, Margarida e Jeremias Bandarra, teve a gentileza de nos indicar o parque de campismo ainda desconhecido de muita gente, mais dada a esta forma de gozar férias sem grandes custos.
A primeira visita terá sido numas miniférias, ao que suponho de Carnaval. Chuva, muita chuva, estragou-nos a festa. Mas nem assim deixámos de programar o acampamento para o mês de agosto. E assim foi. Nesse longínquo mês de agosto e noutros que se lhe seguiram. O parque de campismo de Serrazes tinha o estritamente necessário, sem luz elétrica. Porém, lá nos adaptámos a essas raras condições de sobrevivência. A luz veio tempos depois.

No dia do nosso casamento

Uma passagem 
pela Figueira da Foz

Na Figueira a recordar tempos idos

Há 50 anos mais uns dias, eu e a Lita passámos, apressados, pela Figueira da Foz. Foi no dia do nosso casamento, 7 de agosto de 1965, no Bunheiro, depois da boda que se realizou em Pardilhó em casa das tias Zulmira e Aidinha, quais mães solícitas como a tia Lurdes. Íamos a caminho da lua de mel numa residencial das Irmãs Concepcionistas, por sugestão de um casal amigo. 
Não importa agora falar do casamento, cuja cerimónia foi presidida pelo nosso comum amigo Padre Lé. Isso ficará para outra ocasião. Hoje quero tão-só recordar o motivo por que a Figueira da Foz ficou nas nossas memórias. 
A madrinha Zulmira, atenta, preocupada e solícita, havia preparado um bom farnel para a viagem e, eventualmente, para o jantar, com um pouco do muito que havia na mesa da boda. Ela garantiu-nos que nada faltaria e estou em crer de que assim seria.
Saímos de Pardilhó no velho Skoda, carro duro mas sempre operacional. Naquele tempo não se dava tanta importância a pormenores de luxos dos carros. Preciso era que andassem e nos levassem onde fosse necessário sem avarias. Nunca me recordo de aquele automóvel nos ter dado qualquer incómodo. Mas adiante.

Os primeiros médicos na Gafanha da Nazaré

Médicos que exerciam 
uma clínica de proximidade

O primeiro médico com consultório na Gafanha da Nazaré foi o Dr. José Rito, o primeiro gafanhão com um curso de medicina. Foi licenciado pela Universidade de Coimbra em 1918. Casou em Ílhavo, foi inspector de saúde e médico municipal.
Os médicos que montaram consultório na nossa terra e que aqui exerceram clínica toda a vida foram os Drs. Joaquim António Vilão e Maximiano Ribau. O Primeiro de Figueira de Castelo Rodrigo e o segundo da Gafanha da Nazaré.
Exerceram a sua profissão em espírito de missão, muito próximos dos seus pacientes. No consultório e nas visitas domiciliárias, constantes naqueles primeiros tempos.
As consultas e os primeiros tratamentos, que não se coibiam de aplicar, tão certos estavam das dificuldades das pessoas, que bem conheciam, suscitaram muitas reações de respeito para com estes médicos.
Como era hábito nessa década, os médicos estabeleciam com as famílias uma avença ano após ano. Dinheiros não abundavam e a mais simples forma era receberem, em paga das consultas, produtos da terra.
Na época das colheitas, cada médico convidava uns amigos que percorriam a freguesia para a recolha do que as famílias ligadas por compromisso oral podiam dar. Depois, os clínicos, como é óbvio, teriam de vender os produtos recolhidos.
Paralelamente, davam consultas a não avençados e a funcionários e trabalhadores de instituições ou organizações, como a Casa dos Pescadores, a Aviação e empresas.
Quando afirmei atrás que exerciam um serviço médico próximo, quis sublinhar a dedicação com que viviam e sentiam os problemas das famílias e pessoas. Muitas vezes eram eles próprios que ofereciam medicamentos a gente mais pobre, aplicando injeções muito em voga naqueles tempos.
Estes médicos, que ainda moram indelevelmente na memória dos gafanhões mais idosos, os que com eles privaram como pacientes, ainda puseram em prática, no dia a dia, uma tarefa pedagógica muito importante, na luta contra a superstição e a ignorância. Importava educar para uma vida mais saudável, para uma alimentação mais correta dentro do possível, para a vacinação e para o recurso às consultas e erradicação das mezinhas tão em voga na década de quarenta do século passado, como ainda hoje em certas famílias menos esclarecidas.

Fernando Martins

25 de Abril — A revolução dos cravos

Evocação do 25 de Abril de 1974




Em 25 de Abril de 1974 alguns militares politicamente mais esclarecidos, os "Capitães de Abril" como ficaram na história, descontentes com a guerra colonial e com algumas leis que afetavam os oficiais de carreira, conspiraram e levaram a cabo uma revolta com o objetivo de instaurar um regime democrático em Portugal. 
Vivíamos numa ditadura corporativa, voltados para África, na senda de um regime que se proclamava de «orgulhosamente sós», na defesa de um país que se afirmava multirracial, multicontinental, uno e independente. 
O analfabetismo era muito. O atraso em relação à Europa era enorme. A guerra colonial, com tudo o que ela teve de mau, gerou descontentamento geral entre o povo, sempre o mais sofredor. A incapacidade de os nossos governantes se adaptarem às correntes do pensamento então dominantes, era notória. A aceitação da autodeterminação das nações africanas era impensável. Tudo isso levou ao Golpe de Estado, seguido de uma Revolução. 
Os militares, que, eventualmente, apenas estariam interessados em acabar com a guerra e estabelecer a democracia entre nós, viram-se ultrapassados com o regresso de exilados políticos, nomeadamente, Mário Soares e Álvaro Cunhal, e com as festas do 1.º de Maio, pela primeira vez celebrado em liberdade em Portugal, com a expressão que lhe era devida. 

Recordações da Páscoa



Primeira Parte

1. A Páscoa celebra, como é sabido, o grande mistério da nossa fé. Há um período, a Quaresma, que nos prepara para isso. Já no fim, o Tríduo Pascal congrega-nos intensamente para a vivência da paixão e morte de Jesus. Silêncio, meditação e oração, com jejuns, abstinências e partilhas, tornam mais expressiva a fé que de Deus no vem para em comunhão com todos construirmos um mundo melhor. Dir-se-á que esse propósito nos deve animar nos passos da nossa existência terrena, não sendo necessária a Páscoa. Para mim, a Páscoa é sempre uma mais-valia para o aprofundamento do meu envolvimento nos projetos da construção de uma sociedade mais fraterna, mais humanista. Por isso, valorizo de modo especial a festa maior do cristianismo. Maior, porque é da Ressurreição de Jesus Cristo que dimana a razão da nossa fé, dom de Deus ofertado a todos os homens e mulheres de boa vontade. Eu preciso da Páscoa. 

Egas Moniz na estação do Porto

  Quando vou ao Porto, a capital do Norte, lembro-me com frequência dos painéis que decoram a sala de entrada da Estação Ferroviária. Nunca ...