Natal da Esperança


1. Disposição do espírito que induz a esperar
que uma coisa se há-de realizar ou suceder.
2. Expetativa.
3. Coisa que se espera.
4. Confiança.
5. Religião: Uma das virtudes teologais.


Dos dicionários


1. Para os cristãos, a esperança é mola-real da fé, que Deus não deixará de oferecer aos homens e mulheres de boa vontade. Predispondo-se a recebê-la, cada um dos que buscam o Todo-Poderoso precisa de cultivar o dom da espera, que também é, ano após ano repetido por esta altura, uma excelente ocasião que a Igreja nos proporciona para revivermos a esperança alguma vez já experienciada. Daí a beleza da quadra natalícia que atravessamos e que nos faz sentir que a meta esperada está à porta do presépio de Belém, onde a humildade humanizada nos aproxima indelevelmente uns dos outros.
A esperança, a tal disposição do espírito que nos induz a esperar que uma coisa se há-de realizar ou suceder, não é atitude espontânea e passiva. Muito menos inata. Ela precisa de ser aprendida e cultivada, educada e alimentada, para se tornar paciente e consciente de que Aquele que há de vir se sinta bem em nós e connosco, alargando-se ao mundo inteiro, como reflexo da Estrela de Belém que a todos ilumina e aquece.

Subsídios para a história das mulheres da Gafanha



Mulheres da Seca do Egas 

As mulheres da Gafanha merecem um estudo profundo sobre o seu papel na construção das povoações e das comunidades desta região banhada pela Ria de Aveiro. É certo que alguns estudiosos e escritores de renome já se debruçaram sobre elas, cantando loas à sua tenacidade e coragem, mas também ao seu esforço, desde sempre indispensáveis na luta de transformação de areias improdutivas em solo ubérrimo. Há décadas, e é sobre essas mulheres que nos debruçamos, elas eram as mães solícitas e amorosas dos filhos, mas também os “pais” que garantiam o sustento da casa, enquanto os maridos se aventuravam nas ondas do mar na busca de mais algum dinheiro que escasseava em terra. 
Em jeito de desafio a quantos podem e devem, pelos seus estudos e graus académicos, retratar as nossas avós, com rigor histórico, já que, hoje e aqui, não há lugar nem tempo para isso, apenas indicamos algumas pistas, que há mais de 50 anos nos foram oferecidas por Maria Lamas, na célebre obra “As mulheres do meu país”, que viu há pouco a luz do dia em 2ª edição, numa iniciativa da “CAMINHO”, e que tão esquecida tem andado.

JÚLIO DINIS PASSOU PELA GAFANHA

De vez em quando, sabe bem reler os clássicos da nossa literatura, nem que daí resulte algum prejuízo, momentâneo embora, para os escritores e escritos mais na berra. E foi isso que me levou, há tempos, a procurar na estante, algo desarrumada, um livro talvez pouco lido, a não ser por curiosos ou estudiosos das coisas literárias. Refiro-me a “Cartas e Esboços literários” de Júlio Dinis, com prólogo do célebre Egas Moniz, sábio que ao mundo e ao Homem muito deu no campo da medicina, mas que ainda encontrou tempo e disponibilidade interior para se dedicar a estudos sobre literatos e questões literárias, com a mesma paixão com que dissecava o cérebro humano em busca de verdades até então ignoradas.
Uma das cartas, agora lida com outro sabor, talvez pelo ambiente que quis e soube criar, referia-se à Gafanha, é certo que de fugida, em termos que me apetece repetir para que não caiam no esquecimento.
Reza assim, na parte que interessa, a missiva dirigido de Aveiro, em 28 de Setembro de 1864, a seu amigo Custódio Passos:

A NOSSA GENTE: PADRE LÉ



Um dia destes, de calor de Verão em pleno Outono, fui à procura do meu amigo e antigo confidente Padre Manuel Ribau Lopes Lé, mais conhecido por Padre Lé, que serviu a Igreja na Gafanha da Encarnação até há pouco tempo. Sentado num sofá, recebe-me de olhos bem abertos. Os olhos que sempre lhe conheci. Cedo, porém, percebi que o Padre Lé, com o peso dos 87 anos de idade e das canseiras, de mistura com recentes achaques, estava fragilizado. 
A recomendação que me acolheu indica que a memória recente tinha dado lugar à mais antiga, para onde ele encaminha, já com alguma dificuldade, as conversas sobre a sua vida sacerdotal. 

UM VELHINHO BONDOSO DA MINHA MENINICE

Ponte da Cambeia
Quando eu era menino, há quase 70 anos, costumava visitar a ria. Ia muitas vezes sozinho para me deliciar, extasiado, com águas correntes, barcos moliceiros e tainhas a saltar. Olhava para as Portas d’água e apreciava a ponte da Cambeia. Do outro lado, o Jardim Oudinot com a sua barraca de madeira, com mesa e bancos, onde alguns, no Verão, saboreavam merendas, antes de dormir a sesta num qualquer recanto a jeito.
Com frequência olhava o regueirão, também conhecido por Canal de Mira, e apetecia-me caminhar pela margem, à cata nem sei de quê. Mas um dia vi, ao longe, um pescador que me atraiu, pela sua postura. Ali estava, sereno, muito atento, fixado nas linhas que tinha na ria. Na ponta, chumbeiras e anzóis, ligados a estropos. Para o menino que eu era, o pescador era um velhinho bondoso, muito calmo, de poucas falas e de sorriso a emoldurar-lhe o rosto de barba semanal. Quando me olhava, sorridente, eu sentia-me muito próximo dele. Era um amigo. Chamava-se Manuel Bola e tinha muitos filhos.
Aproximei-me, um pouco tímido (nunca fui muito metediço), e nem recordo se o saudei. Sei, isso sim, que o olhei e sorri, em resposta ao seu sorriso. Ali fiquei à espera do peixe que tardava. Depois ele disse:

UM ANTIGO ALUNO DA MANTA ROTA


Fernando Neves, Veríssimo Salvador,
Lucílio Marçalo e Hélder Mateiro


Por ter estado no Algarve lembrei-me de um aluno, Veríssimo Salvador, oriundo da Manta Rota. Foi há 50 anos, na Escola da Chave. Tive o prazer de o rever no almoço com antigos alunos, no restaurante Traineira, no dia 2 de agosto, ao lado de outros colegas.
Na altura sentia-se um grande incremento na Pesca do Bacalhau. A Gafanha da Nazaré muito beneficiou dele, com empresas a darem trabalho a imensa gente, que vinha de todos os cantos do litoral português. Notávamos isso no linguajar dos que chegavam para ficar na região. Uma criança entra-me na sala por transferência. Quando indaguei da sua naturalidade, respondeu-me, com ar cândido, que era do Algarve, de Manta Rota. Logo a malta riu a bom rir, como era natural, pelo ineditismo do nome da terra algarvia. 
Confesso que nunca tinha ouvido falar de tal terra e também sorri. E começou a conversa, naturalmente, para levar o aluno à integração no meio escolar. E as perguntas, minhas e dos então seus colegas, surgiram, numa tentativa de se saber a origem de nome tão diferente dos que conhecíamos à nossa volta.
Nessa época, viajava-se pouco. Os horizontes da grande maioria das crianças não ultrapassavam a ria e o mar das proximidades. Tanto assim, que cheguei a encontrar, noutra escola onde lecionei, na Marinha Velha, da mesma freguesia, alunos que nunca tinham visitado a Barra e a Costa Nova, povoações que ficam, para quem não conhece bem a região, do outro lado da laguna.

O PRIMEIRO EMPREGO

O drama do primeiro emprego é terrível nos tempos que vivemos. Os jovens, na ânsia de conseguirem alguma independência económica, passam às vezes por situações difíceis.
Nas últimas férias grandes, um desses jovens lá foi em busca de trabalho. Bateu a diversas portas e todas se mantiveram fechadas. Mas uma abriu-se. "Que sim, que podia começar no dia seguinte, para substituir um empregado em férias. O ordenado via-se depois. Teria alimentação na própria casa (café-bar dos arredores da Gafanha) e o horário de trabalho seria o normal." Tudo certo.
Ao fim do primeiro mês, foi informado de que seria melhor receber no fim do contrato verbal, nunca oficializado. E assim aconteceu.
- Muito obrigado pelos teus serviços. Foste um trabalhador dedicado - disseram-lhe os patrões. Toma lá 30 contos pelos três meses.
- Fiquei desolado, senhor professor. Fui competente, dedicado, trabalhei em média 12 horas por dia e no fim recebi por três meses o que esperava receber por cada um. Eu comia, é verdade, mas também trabalhava 12 horas ou mais por dia. E sabe uma coisa? Na sua freguesia são tidos por gente de respeito, cristã e honesta.

Fernando Martins

TIMONEIRO, Fevereiro de 1990

NOTA: Injustiças são, infelizmente, de todos os tempos. Em 1990 como hoje....

Egas Moniz na estação do Porto

  Quando vou ao Porto, a capital do Norte, lembro-me com frequência dos painéis que decoram a sala de entrada da Estação Ferroviária. Nunca ...